sábado, 3 de agosto de 2019

II. OS IRMÃOS DE MANOEL SOARES GOMES, PAI DE THEOPHILO

Neste capítulo, procuro avançar na caracterização do contexto familiar e social de TSG, reunindo as informações que consegui obter sobre Miguel, Joaquim e Antônio Soares Gomes, irmãos de Manoel Soares Gomes, pai de TSG, que também emigraram para o Brasil. Tais informações foram extraídas, em sua maioria, de antigos periódicos da imprensa paranaense, cujo primeiro jornal, o “Dezenove de Dezembro”, surgiu junto com o início da vida do Paraná politicamente independente. Miguel Soares Gomes faleceu em Paranaguá no dia de seu aniversário natalício aos 78 anos de idade, em 1903, por onde se deduz que nasceu em 1825 (mais velho que Manoel, nascido, como vimos, em 1829). Foi da Marinha de Guerra do Brasil, tendo a deixado no posto de 2º tenente. Em 24 de dezembro de 1889, participou da instalação do Club Republicano em Antonina, pois seu nome aparece como um dos subscritores da respectiva ata (36). Joaquim Soares Gomes nasceu em 1833 e faleceu em 19 de setembro de 1910 (37). Pelas múltiplas referências a ele na imprensa paranaense, teve uma atuação bastante relevante na comunidade de Paranaguá, à qual, aparentemente, esse português se integrou muito bem. Foi importante homem de negócios, especialmente na área do comércio exterior, sendo consultado em 1882 pelo presidente da Província sobre tarifa aduaneira, juntamente com o Visconde de Nácar, Ildefonso Pereira Correia (Barão do Serro Azul), Francisco F. Fontana, comendador Araújo e outras 6 pessoas). Exerceu o jornalismo, tendo redigido “Echo Litterario” e “O Ityberê”, publicações do tradicional Club Literário de Paranaguá, do qual foi também presidente em 1880-81 (38). O “Echo Litterario”, conforme informa uma edição de 1875 (39), era uma publicação hebdomadária, com uma Comissão de redação integrada por Joaquim, Soares Gomes, Dr. Leocádio José Correa e Francisco J. Machado da Silva. Quanto à outra publicação mencionada, segundo uma edição de “O Paranaense”, de janeiro de 1882 (40), o Club Literário de Paranaguá imprimiria uma folha hebdomadária (“humorística, literária, comercial e noticiosa”) intitulada “O Ityberê”, que seria redigida por Joaquim Soares, Dr. Leocádio Correia, Leocádio Pereira, Fernando Simas, Manuel Souza e outros. Joaquim também colaborou para “O Século”, surgido em 1891 e dirigido pelo seu concunhado dr. João Evangelista Espíndola. Durante trinta e cinco anos Joaquim foi o representante consular de Portugal em Paranaguá, além de também ser o agente consular da Inglaterra e França nessa importante cidade portuária do Paraná (representou ainda outros países, em certos períodos). Ele subscreveu, em 1859, com outras 12 pessoas, o Compromisso da Irmandade do SS. Sacramento de Paranaguá. Pertenceu à loja maçônica “Perseverança”, da qual foi um dos fundadores, em 1864, integrando a sua primeira diretoria. A loja empregou seus fundos na libertação de escravos. Em 1876, o “Dezenove de Dezembro” menciona Joaquim como o delegado, na província do Paraná, do Grande Oriente Unido, cujo chefe nacional é o conselheiro Joaquim Saldanha Marinho. Aliás, o mesmo jornal, no ano anterior, sob o título “Festa maçônica em Paranaguá”, informou o desembarque de Saldanha Marinho na cidade, de passagem para o Rio Grande do Sul, participando de um almoço que aí lhe foi oferecido, ocasião em que Joaquim ergueu o primeiro brinde (41). Esse tio de TSG foi também um dos fundadores do Club Republicano de Paranaguá, fundado em 1887 segundo Francisco Negrão (“Genealogia Paranaense”, v. 6, p. 247). Mas esteve presente no baile oferecido a D. Pedro II, em 19 de maio de 1880, quando da visita do Imperador ao Paraná, conforme a “História de Paranaguá” citada na nota (41), p. 323). Joaquim foi também presidente da Sociedade Portuguesa de Beneficência, de Santos, no período 1901- 1904 (fonte: site Wikipédia). Ainda em 1875 participou de uma sociedade destinada a introduzir e estabelecer aqui 4000 colonos europeus. Defendeu que o ponto de partida da linha férrea a ser construída desse preferência ao porto D.Pedro II de Paranaguá e reivindicou, juntamente com outros representantes do comércio e indústria do Paraná, a construção de um cais nesse mesmo porto. Casou em 1871 com D. Josephina Pereira Alves Soares Gomes (1844-1917), filha de Antônio José Pereira, irmão do último capitão-mor (e primeiro prefeito) de Paranaguá Manoel Antônio Pereira. O casal não teve filhos. (42) Alberico Figueira refere-se em artigo ao “cônsul inglês em Paranaguá, o jornalista e poliglota Joaquim Soares Gomes”. Em outro artigo (de 1938), afirma que ele “foi uma das mais expressivas mentalidades daquela época” (43) Sobre ele, “O Itiberê” (agora uma revista, e não jornal) numa edição de 1968, afirmou na legenda à foto de um desenho que reproduz “O Solar do Capitão-Mor”: “Aqui Joaquim Soares Gomes, português ilustre, expatriado como Miguelista, reunia a intelectualidade paranaense de sua época. Correia Defreitas, Leôncio Correia, José Henrique, João Régis e Nestor Victor foram ancilas suas, ele, Tio Soares, o fulgurante Sol”. Essa menção à sua condição de “miguelista”, i.e. partidário de D. Miguel, adversário de D.Pedro IV em Portugal (o nosso D.Pedro I), sugere uma motivação política para a vinda de Joaquim (e seus irmãos) para o Brasil. É uma possibilidade, considerando que eles não vieram para cá em situação econômica muito ruim, pois logo se dedicaram a um comércio de porte maior, que exigia mais capital, em vez de um pequeno comércio local de secos e molhados, por exemplo. Nessa mesma edição de “O Itiberê”, num artigo de Anthero Regis sobre Nestor Victor, após referir-se à educação formal do escritor, consta o seguinte: “O melhor, contudo, de sua formação cultural básica obteve no convívio que fez, constituindo o grupo de rapazes daquela época que frequentavam o escritório do português Joaquim Soares Gomes, grupo onde destacavam-se Correia Defreitas, Eliseio Pereira Alves, Leôncio Correia, João Régis Pereira da Costa e José Henrique Santa Rita” (44). Alberico Figueira, em artigo publicado numa edição de 1939 de “O Dia” (45), lembra conferência de Vicente Machado no Club Republicano de Paranaguá em 13 de novembro de 1889 e faz este comentário interessante sobre Joaquim Soares Gomes: “/.../ o hóspede dos republicanos, quando não se achava no hotel em que se hospedara, fazia ponto de palestra no escritório do ilustre jornalista português sr. Joaquim Soares Gomes, personalidade de destaque nos meios intelectuais /.../ O escritório do venerando Soares Gomes era evidentemente onde se reuniam todos os homens de cultura que passavam naquela época por Paranaguá. Ali discutia-se com elevação de espírito todas as questões sociais e políticas que agitavam o mundo e Soares Gomes, pela sua cultura, pelos seus conhecimentos práticos, sua palavra erudita disputava o maior interesse da roda que dele se acercava.” O terceiro irmão de Manoel, Antônio Soares Gomes, que sempre residiu em Antonina, faleceu em 1927, de acordo com esta nota publicada no “Diário da Tarde”: “Anteontem, na cidade de Antonina, faleceu o venerando comendador Antonio Soares Gomes, sogro do coronel Lauro Loyola, pai da viúva coronel Francisco Marçallo e tio do coronel Theophilo Soares Gomes. Foi comerciante, agente de companhia de vapores, industrial e representante de consulados, desde o tempo do antigo regime, muito estimado e conceituado naquela cidade litorânea, onde sua morte, bem como em outras localidades /.../, foi grandemente sentida” (46). Sua esposa foi a professora Maria Júlia da Costa Soares Gomes. O casal teve três filhas: 1) Maria Joaquina, casada com o coronel Francisco Marçallo, já falecido em 1927, como se viu acima, pois fora vítima de um “desastre de automóvel quando de Antonina se dirigia para Curitiba pela Estrada da Graciosa”, conforme Francisco Negrão, que o chama de “ativo e abastado comerciante” (para Octavio Secundino, era um “grande embarcador e industrial); 2) Ana Emília, esposa do coronel Lauro do Brasil Loyola, “homem do alto comércio e político de escol”, segundo Secundino. F. Negrão afirma que Lauro foi prefeito municipal de Antonina e deputado estadual; e 3) Ismênia, casada com o cel Theophilo de Oliveira Marques, falecida logo após o casamento (47). Octavio Secundino também informa que Antônio, além de dominar a legislação mercantil e lecionar contabilidade, sabia bem francês, tendo dado aulas desse idioma ao jornalista Nestor de Castro e aos poetas paranaenses Thiago Peixoto e José Cadilhe. Em 1877 ele era o delegado em Antonina do vice-consulado português de Paranaguá. Em 1885, quando o presidente da província Taunay visitou o litoral paranaense, instalou diversas sociedades locais de imigração, inclusive a de Antonina. Na diretoria então escolhida, Antônio Soares Gomes ocupa o cargo de tesoureiro (48). Na edição citada de “Futuro”, na nota 48, é publicado o texto do “Manifesto” da Sociedade Central de Imigração, fundada por Alfredo d’Escragnole Taunay, datado assim—Rio de Janeiro, 21.10.1885. E em “Futuro” de 14.12.1885, p.3, consta o “Prospecto Geral” dessa Sociedade para a organização de companhias regionais de imigração. As companhias funcionavam como empresas de imigração (mandando vir da Europa seus compatriotas, facilitando-lhes o transporte etc) como sociedades cooperativas de consumo e como caixas econômicas. No tempo do Império, Antônio vinculou-se ao partido Liberal, como seu sobrinho TSG. Em 1881, consta no “Dezenove de Dezembro” (49) matéria sobre o baile realizado em Antonina em homenagem ao chefe do Partido Liberal da província conselheiro Jesuíno Marcondes de Oliveira e Sá. Na relação das 93 pessoas signatárias da felicitação lida pelo representante da municipalidade são citados, além de A. Alves de Araújo e M. Alves de Araújo, os nomes de Antônio e TSG. A nota do DD chama os signatários de “93 dos principais cidadãos de Antonina”. Em 1888, conforme ata da 7ª sessão ordinária da Assembleia Provincial, publicada no “Dezenove de Dezembro” (50), Felipe Pereira Caldas e Antônio Soares Gomes deram entrada na Assembleia de um requerimento “pedindo isenção do pagamento de direitos por 15 anos para estabelecerem uma fábrica de destilação de cereais e fabricação de álcool”, o que mostra a intenção de Antônio de envolver-se também na atividade industrial e diversificar suas atividades. Logo após a proclamação da República, em 26 de dezembro de 1889, o governador do Paraná encaminhou ao novo governo do país proposta de Antônio “de realizar um serviço de navegação regular a vapor, entre diversos pontos do litoral”. Em resposta ao governador, o ministro Francisco Glicério, do governo provisório da República, afirmou que tal proposta seria levada em consideração oportunamente. Abaixo, uma síntese das menções mais significativas relacionadas a Antônio nos órgãos de imprensa pesquisados. Em 1901, em várias edições de “A República”, o nome de Antônio consta em relação dos exportadores de erva-mate (para Buenos Aires, Rosario e Montevideo) por Antonina. Em 1903, ele pertencia ao Partido Republicano Federal e participou da escolha de seu novo diretório de Antonina, formado pelos coronéis Theophilo Soares Gomes (seu sobrinho), Lauro do Brasil Loyola (seu genro) e Líbero Guimarães. Nesse mesmo ano, um telegrama publicado em “A República” informa que Antônio foi nomeado vice-cônsul da República Argentina em Antonina (já fora vice-cônsul do Chile, até 1900). Em 1905 foi eleita a nova mesa e conselho fiscal da Casa de Caridade de Antonina, sendo escolhido Theophilo Soares Gomes como provedor. Antônio foi um dos 54 “irmãos” que votaram nessa eleição. Em 1907, a visita de Antônio a Curitiba, com o genro, Lauro Loyola, é registrada pela imprensa, que chama tais “coronéis” o primeiro de “respeitável capitalista” e o segundo, de “conceituado comerciante” de Antonina. Em 1908 foi instalado o partido da Coligação Republicana em Antonina. O diretório local então formado é presidido pelo cel Lauro Loyola. Antônio também integra esse diretório. Já em 1909 ele foi um dos membros desse partido que escolheram as comissões que se encarregariam dos serviços eleitorais no pleito de 30 de janeiro para a escolha dos integrantes do Congresso federal. Em 1914 o “Diário da Tarde” publica ata da reunião, realizada em 14 de março, da Assembleia de acionistas do Banco de Curitiba, com a relação de todos eles, um dos quais era Antônio Soares Gomes. Nesse mesmo ano, o Hospital de Caridade de Antonina empossou a mesa eleita para o ano 1914-15. O provedor é Lauro do Brasil Loyola e Antônio integra o Conselho Fiscal. Uma edição de “A República”, em 1917 (51) registra o aniversário, ocorrido no dia anterior, de D. Maria (Júlia, acrescento eu- DvE) da Costa Gomes, esposa do “venerando comendador Antonio Soares Gomes”. Artigo de Octavio Secundino, de 1929, sobre a festa de N. Sra. do Pilar, em Antonina, menciona o tradicional Club Antoninense, “criado em agosto de 1873”, “onde não há muito tempo encantaram com sua proveitosa ação: Coronel Theophilo /.../, Coronel Marçallo /.../, Antônio Soares Gomes, Lauro Loyola /.../”(52).

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